Júlio de Castilhos
quarta-feira

22 de janeiro de 2025

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O que é mesmo superação? Buscando no dicionário é fácil pois o vocábulo remete a ultrapassar uma situação desagradável, perigosa. Há exemplos magníficos de superação de doenças entre nós, humanos. Mas superar é uma ação de vencer, de conseguir a vitória, ou seja: sobrepujamento. Superar implica em vencer tudo e todos, sobretudo a si próprio.

Em minhas leituras juvenis aprendi muito com Fernão Capelo Gaivota (Richard Bach) e o crédito de muitas superações em minha vida foram resultado das adversidades que se impunham cotidianamente. A origem humilde e de poucos recursos (sem bolsa família, cesta básica ou outros lenitivos sociais contemporâneos) forjaram uma tenacidade que exigia e clamava “passar por cima”. Mas o porquê de falar em superação em um momento desses?

Finalizados os Jogos Paraolímpicos, nada mais justo e digno do que parar um pouco e refletir sobre o que aquelas pessoas que, em tese, teriam extremas limitações, se superarem e dar exemplos de vida. Ao ver uma pessoa de altura reduzida, com membros superiores e inferiores reduzidos e atrofiados superar outros adversários e lograr uma medalha de ouro na natação, isso é superação! Mas também tem o caso do jogador de futebol que nasceu cego e que jogava com os amigos que enxergavam e se guiava pelo som da bola no campo de areia (sim ele é ouro e pentacampeão). Tem também o deficiente visual que salta em altura ou distância.

É muito gratificante ver pessoas que a despeito de alguma limitação superam, em primeiro lugar, as suas deficiências, mas, sobretudo, as limitações de uma sociedade que se forjou para uma maioria dita “normal”. Claro, sem querer ser preconceituoso ou politicamente incorreto, o fato é que a humanidade nunca teve a oportunidade de prestar atenção ou reverter recursos para estas pessoas.

Com o avanço científico e econômico, felizmente, as coisas mudaram. Então, se vemos corredores cegos, lançadores de dardo sem braço, jogadores de vôlei com limitação de locomoção, como admitir um Complexo de Vira-latas (Nelson Rodrigues)? Não, não podemos impichar o selo de malsucedido, mal resolvido, incapaz quando existem seres que em condições para além de indesejáveis, presumíveis e até mesmo suportáveis, conseguem fazer o impensável.

Na atualidade há um termo para aqueles que se lamentam sem razão, ou seja: mi mi mi. Fazer mi mi mi é reclamar, sem motivo, de uma situação que pode ser vencida com facilidade. Sou de uma geração onde o transporte coletivo era deficiente, não havia internet e os conhecimentos disponíveis estavam guardados em bibliotecas físicas. Nada disso impediu que se buscasse informação. Hoje em dia parece que a informação universalmente disponível não chega a bom termo para as pessoas e na esteira vem o chororô.

Creio que o ânimo e a disposição dos paratletas (sobretudo os brasileiros que lograram 72 medalhas em Tóquio) sirvam de exemplo para todos nós. Sei que por natureza somos cordiais e dominados pelo coração, como diria Sergio Buarque de Holanda, mas doses de ceticismo, credulidade e de objetividade fariam bem aos nossos queixumes. Por enquanto fica o exemplo de superação que poderia ser tomado como guia de vida. Mas como é que se fala quando se tem quase de tudo e não se faz nada por merecer?

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