Júlio de Castilhos
quarta-feira

22 de janeiro de 2025

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Julgamento Boate Kiss: os quatro réus pelo incêndio são interrogados

Confira como aconteceu o oitavo e nono dia de julgamento, que contou com interrogatório dos réus

O maior julgamento da história do Rio Grande do Sul, o incêndio da Boate Kiss que deixou 242 pessoas mortas em 27 de janeiro de 2013 em Santa Maria, já segue por nove dias. A duração, na última semana, ultrapassou o júri do Caso Bernardo, que durou cinco dias no município de Três Passos no ano de 2019.  

O julgamento do Caso Kiss, desde seu início no dia 1º de dezembro, já ouviu mais de 20 pessoas entre vítimas e informantes. Neste momento atual, foi encerrada a etapa de oitivas desse público e o júri passa a ouvir agora apenas testemunhas e os quatro réus, Elissandro Callegado Spohr e Mauro Londero Hoffmann, sócios da Kiss, o músico Marcelo de Jesus dos Santos e o produtor de palco Luciano Bonilha Leão. Os quatro réus são acusados pelo Ministério Público (MP) por terem agido com dolo eventual, quando é assumido o risco de matar, pela morte de 242 pessoas no incêndio da boate, e responderão também por 636 tentativas de homicídio, representando o número de feridos no ocorrido.  

Nessa quarta-feira (08), foram ouvidos dois depoimentos aguardados pelo julgamento do caso: o prefeito de Santa Maria na época da tragédia, Cezar Schirmer, e o promotor de Justiça Ricardo Lozza, responsável pelo inquérito civil que estabeleceu um termo de ajustamento de conduta (TAC) para a restrição da poluição sonora da Kiss que gerava reclamações de vizinhos da boate na época.  

Cezar Schirmer foi quem deu início aos depoimentos. Na época do incêndio, a Polícia Civil recomendou que o ex-prefeito fosse processado judicialmente, mas a recomendação foi arquivada. Em sua fala, Schirmer relata que a prefeitura de Santa Maria foi muito investigada.  

“Havia um esforço desde o início no sentido de dizer: “Falta mais gente para ser julgada”. É uma narrativa, para responsabilizar 50, 30, 20, e diminuir as responsabilidades individuais. Sou advogado, compreendo. Mas não fiz nada, doutor. (…) A prefeitura de Santa Maria foi a mais investigada do planeta e não acharam nada” disse o ex-prefeito para o Juiz Orlando Faccini. Durante seu depoimento, os familiares das vítimas que assistiam ao julgamento se retiraram.  

No depoimento de Ricardo Lozza, o promotor diz ter escutado inverdades em relação à Boate Kiss. Entre elas, está o questionamento do motivo pelo qual o Ministério Público não fechou o estabelecimento. Segundo os advogados de defesa dos réus, a boate só estava funcionando, ainda com irregularidades, porque o promotor permitiu.  

“Não fechei porque não sou autoridade administrativa. Eu não tinha esse poder. Quem tem poder de polícia para fechar uma boate é a prefeitura, a municipalidade.” disse Ricardo. 

Depoimentos dos réus

A terceira pessoa a depor nessa quarta-feira foi o réu Elissandro Callegaro Spohr, que era sócio da Kiss. Elissandro contou sobre como foi seu desenvolvimento na boate e também sobre as reformas realizadas em função do som. Segundo o réu, existia uma questão problema com uma vizinha e que foram feitos diversos processos para conter os ruídos da boate. Além disso, Spohr contou sobre a instalação sobre a espuma que incendiou na madrugada de 27 de janeiro, que foi instalada por seus funcionários e não era recomendada pelo engenheiro Miguel Pedroso, que também prestou depoimento no júri.  

Ao seguir seu relato, Elissandro deu início a um dos momentos mais tensos e também dolorosos do júri até o momento, quando detalhou como aconteceu o incêndio.  

“Não tinha explicação. Falaram em 30 pessoas, e na rádio começou a aumentar as pessoas. Eu não sabia o que fazer. Querem me prender, me prendam, estou cansado” disse Kiko, enquanto chorava e gesticulava nervosamente. “Eu perdi um monte de amigos. Perdi funcionários. Eu não quis isso, não escolhi isso.”  

Kiko se virou para as famílias, na parte de trás do plenário, e falou que não sabia como pedir desculpas. Mencionou os outros réus, dizendo que nenhum agiu intencionalmente.  

Nono dia de julgamento

Nessa quinta-feira (09), o julgamento deu continuidade aos depoimentos dos réus. O segundo réu a depor foi o produtor de palco da banda Gurizada Fandangueira Luciano Bonilha Leão.  

O réu mostrou para os jurados uma sacola de remédios que usa continuamente em função dos problemas psicológicos após a tragédia da Boate Kiss. Chorando, Luciano fala sobre a luta por justiça pela morte de seus filhos, e diz para o condenarem se isso contribuirá para tirar a dor das famílias.  

“Esses pais são legítimos em lutar pelos filhos deles. Mas eu tenho a consciência tranquila que o meu ato não causou a morte desses jovens. Mesmo assim, se for para tirar a dor dos pais, eu estou pronto: me condenem. Mesmo eu sabendo que eu sou inocente” disse o ex-produtor de palco.  

O terceiro réu a ser interrogado foi Mauro Hoffmann. Mauro não estava na boate no dia do incêndio, e contou que assim que soube da notícia, se dirigiu para o local.  

“Eu peguei meu carro imediatamente e fui para a boate. Até hoje não sei como cheguei lá tão rápido. Eu olhava as pessoas e via elas com os olhos brancos. Acho que por causa do queimado. Era cena de horror” disse o ex-sócio.  

O réu, que falou calmamente, pediu perdão para Santa Maria e para as famílias das vítimas.  

“Eu quero pedir perdão para os pais, para a sociedade de Santa Maria. Ninguém queria aquilo lá, ninguém imaginou aquilo” disse Mauro.

Na tarde dessa quinta-feira, foi ouvido o terceiro réu do dia: Marcelo de Jesus dos Santos, que era vocalista da banda Gurizada Fandangueira. Marcelo conta que teve apenas uma chance para apagar o fogo que iniciou na espuma do teto da boate, mas que o extintor não funcionou. Segundo o réu, ele gritou para que as pessoas saíssem do local, mas que não foi o suficiente. 

“Ninguém em sua sã consciência ia imaginar que ia acontecer aquilo ali, daquele tamanho. Era uma cena de horror. Nem em um filme se vê o que eu vi ali dentro e lá fora. Dia 27 nunca saiu de mim, eu acordo e durmo pensando no dia 27” relatou Marcelo.

Após os quatro réus serem interrogados, começa nessa quinta-feira a fase dos debates entre a acusação e a defesa. Os advogados e promotores terão um tempo de nove horas para argumentarem sobre a condenação ou absolvição dos quatro réus do caso da Boate Kiss. Segundo informações divulgadas pela GaúchaZH, o julgamento entra em fase final e a sentença é estimada para ser realizada na madrugada deste sábado (11).

Jefferson Botega / Agência RBS

Jefferson Botega / Agência RBS

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