Um levantamento realizado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa, registrou que nas últimas três safras o Rio Grande do Sul e o Paraná, segundo e terceiro maiores produtores de soja do Brasil deixaram de produzir mais de 15 milhões de toneladas do grão. Tal fator resultou em um prejuízo de U$ 8 bilhões, com o valor de U$500,00 a tonelada. O responsável dessa quebra de safra é a falta de água para o desenvolvimento pleno da cultura. Motivados por essa demanda, a Embrapa traz a contribuição do pesquisador da Embrapa Soja José Renato Bouças Farias e outros especialistas para compartilhar o conhecimento de ações no campo que possam contribuir para o melhor desenvolvimento da safra de soja, preservando a água e diminuindo os impactos da deficiência.
José Farias cita como principais ações para a demanda de falta de água as práticas de manejo e conservação do solo e da água, a diversificação de culturas, o plantio direto na palha, preservação de nascentes, rios e margens de rios e adoção de boas práticas na cobertura do solo.
A soja e a água
De acordo com o pesquisador Renato Farias, a constante elevação nas temperaturas se deve pelas mudanças climáticas, aumentando a demanda da soja por água. Para a produção agrícola é necessário não somente de um volume de precipitações adequado, como também uma boa distribuição. Porém, com as secas mais frequentes e as chuvas torrenciais, não há boa distribuição no decorrer do ciclo.
Segundo a Embrapa, mais de 95% da soja no Brasil é cultivada em regime sequeiro, ou seja, sem irrigação. Para a soja, são necessários cerca de 8 milímetros de água ao dia para a floração e o enchimento dos grãos, pois cerca de 90% do peso da planta de soja é formado por água. Para obter um ciclo ideal na safra de soja, a quantidade de água varia entre 450 a 800 mm por ciclo, dependendo das condições climáticas, do solo, do manejo da cultura e também da duração do ciclo.
Estratégias para diminuição dos impactos da falta de água
O pesquisador da Embrapa Soja cita o ajuste fitotécnico das cultivares para suavizar os efeitos da seca. O ajuste ocorre por meio da adoção de variedades adaptadas para cada região de forma escalonada para ciclos e semeadas diferentes. A ação pode contribuir para o aumento das chances de escape das lavouras em relação à incidência de veranicos na fase dos enchimentos dos grãos.
“Chamamos de estratégia de escape para reduzir os prejuízos, porque se você planta a mesma cultivar em toda a lavoura e não escalona a semeadura é mais difícil diluir os riscos, se houver algum problema climático” explica José.
Apoio da biotecnologia
Outra ferramenta que pode contribuir para a diminuição dos efeitos da falta de água na cultura da soja é o desenvolvimento de grãos mais tolerantes à seca. Segundo a pesquisadora Liliane Mertz-Henning para a Embrapa, a característica de resistência à falta de água nas cultivares é comandada por muitos genes, assim dificultando o processo de introdução dessa capacidade por meio do melhoramento genético clássico.
Para o desenvolvimento de uma solução, a Embrapa Soja realizou pesquisas em conjunto com institutos do Japão (Universidade de Tóquio, Riken, Japan International Research Center for Agricultural Sciences – Jircas) que mostram que a biotecnologia pode contribuir para tornar a soja mais resistente aos períodos de seca. Isso acontece por meio da manipulação genética, onde é introduzido um gene que torna a planta mais tolerante à falta de água para o seu desenvolvimento.
“Essas plantas foram testadas em condições de casa-de-vegetação e campo com resultados promissores, mostrando que as plantas transgênicas apresentam maior estabilidade de rendimento frente ao estresse. No entanto, os aspectos regulatórios associados aos Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) dificultam a disponibilização dessas tecnologias no mercado” explica a pesquisadora Liliane.
Diversificação de culturas e manejo do solo
Essas práticas são recomendadas para melhorar a construção do perfil do solo, aumentando o armazenamento, o enraizamento da planta com profundidade, a maior infiltração de água e a diminuição do escorrimento superficial.
Uma alternativa de diversificação é o consórcio da cultura de milho com braquiária, prática ressaltada pelo pesquisador Henrique Debiasi para a Embrapa. O consórcio não muda muito o sistema operacional, mas impacta significativamente a qualidade dos sistemas de produção. A prática é o primeiro passo para diminuir os efeitos da compactação do solo, que atrapalha a infiltração de água.
Segundo levantamento da Embrapa pelo IDR-PR e pela cooperativa Cocamar, no Paraná, as áreas que cultivaram milho consorciado com braquiária apresentaram um ganho de 20 mm/hora na taxa de infiltração a cada ano de utilização do consórcio. Desse modo, a taxa de infiltração nas áreas que usam consórcio há mais de cinco anos ultrapassa 100 mm/hora. Quando essa taxa aumenta, impacta diretamente na conservação do solo e da água pois diminui consideravelmente o escoamento de água na superfície do solo, reduzindo a erosão.
Além das práticas citadas, a Empresa Brasileira traz também como ações no campo o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc), uma ferramenta de análise dos riscos de mudanças climáticas, considerando as características específicas da cultura e do solo. O Zarc permite que o produtor identifique a melhor época para plantar de acordo com a região, a cultura e os tipos de solo, reduzindo assim os riscos em relação aos problemas climáticos. É recomendado também pelos especialistas as práticas de sequestro de carbono na produção de soja, utilizada para diminuir os gases do efeito estufa.