A história do meu primeiro mochilão começa bem antes dele, de fato, acontecer em 2010. Por volta dos meus 15 anos, tinha a mania de ir as cidade vizinhas com uma mochila, sem conhecer ninguém, e ver o que acontecia. Nunca precisei dormir na rua.
Encaro essa fase como um treinamento para o que estava por vir: um mochilão de 51 dias, sem celular, saindo com pouco dinheiro, sem lugar pra ficar ou qualquer tipo de planejamento prévio.
Não sei se já citei minha mãe aqui. Minha mãe é uma intelectual, ela tem certeza que sabe mais de medicina que o médico, mais de mecânica que o mecânico e mais que você, seja lá qual for a sua profissão. Isso é mérito do seu grande intelecto e explica o quão irritante eu sou.
Minha mãe cresceu no interior de Restinga Seca, cidade bem pequena e essencialmente rural. Até boa parte da adolescência, não tinha água encanada e até prestar vestibular não tinha luz elétrica. Estudava com luz de lampião e recortes de jornal (que vinham com dicas). Aos 16 anos passou no primeiro vestibular para Pedagogia, aos 17 passou em filosofia e aos 21 já era formada em duas graduações.
Não fosse meu pai alcóolatra tê-la engravidado duas vezes (uma das quais eu fui gerado), ela hoje seria algo como dona do Planeta Terra. Mas ela escolheu ser, além de foda, uma mãe foda. E mãe solteira, pois quando eu tinha 1 mês de vida, meu pai sumiu. Graças a essa grande perda de tempo acadêmico, ela foi fazer seu mestrado com 42 anos. Mas tudo bem, ela realizou os sonhos dela, viajou o mundo, tem uma situação financeira estável e é uma profissional respeitada.
Aí você imagina, com todas as dificuldades que ela passou, olhar para o filho (que teve tudo) estar com 21 anos e ter largado o terceiro curso de graduação. Cursei alguns meses de Direito, Jornalismo e dois anos de Bacharelado em Estatística. Quando larguei o último, minha mãe me deu R$300 (trezentos reais) e disse que aquele era o último dinheiro que ela me daria até eu definir o que queria da minha vida. E se ela disse: tá dito.
Entenda: eu já trabalhava desde os 16 anos como garçom, morava na garagem da casa da minha avó (que também era estúdio para a minha banda), mas ali eu entendi um pouco que minha mãe estava desistindo de mim e que tinha que escolher o que queria da vida.
Na verdade, deixei para descobrir isso na volta. TREZENTOS REAIS em 2010 era um bom dinheiro! Liguei para o Cadico, meu amigo na época, perdi o contato, e perguntei o que ele faria amanhã. Decidimos então que era a hora de botar o pé na estrada e ir trabalhar no verão em Florianópolis.