Júlio de Castilhos
quarta-feira

22 de janeiro de 2025

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Mochilão | Parte 2: A Casinha de Boneca

Essa história chegará no ponto de viagens de trem, navio e caminhão, mas quero ser fiel aos acontecimentos e, nesse início, comecei pegando um ônibus na rodoviária. Mas se é emoção que queres, chegamos em Florianópolis sem ter onde ficar. Da rodoviária, formos até o campus da UFSC, onde encontramos anúncios de kitnets no Morro do Pantanal – que fica atrás da universidade. Já passava da meia noite e, após uma senhora subida (reforço: era muito íngreme!), chegamos e nos alojamos.

(Eu voltaria ao morro do pantanal alguns anos mais tarde, na casa de um amigo que estava lá (por indicação minha). Fui visitá-lo e passamos um carnaval inteiro fingindo ser gringo como estratégia de cortejo. Um dia te conto essa história.)

Apenas um amigo, que eu saiba, foi antes de mim trabalhar em Floripa: o Matheus Izaguir. Logo depois do seu casamento. E o conselho que ele me deu foi: vá a Canasvieiras! E lá fomos nós. Eu e o Cadico.

Pegamos o ônibus na Trindade e, atravessando a cidade, em direção ao norte da ilha, finalmente ouvi o mar. Paramos em frente ao Supermercado Magia e ao lado estava o Restaurante Candeas com uma placa “contrata-se”. Entramos e já conseguimos o emprego. Sim, no primeiro lugar que entramos. Muita sorte? Na saída vimos que quase todos os estabelecimentos tinham a mesma placa. Não sei como é hoje, mas naquela época, realmente era o paraíso do emprego.

Com o tempo fomos entendendo o porquê. É uma jornada de trabalho tenebrosa. Das 9h às 15h e das 18h às 02h. Essa era a minha escala. Ganhava 10% do valor total do caixa por dia, dividido entre os 10 garçons, o que dava entre R$100 e R$250, mais as gorjetas (que chegavam a R$50 nos grandes movimentos) e ainda o salário mínimo que, se não me engano, era R$600. Bom, certo? Eu me sentia milionário! Nunca tinha ganhado tanto dinheiro na vida! O problema era onde morávamos. Não bastava a jornada longa de trabalho, ainda tinha uma hora de ônibus para ir e uma hora para vir do Morro.

Após uma semana, tornou-se obrigatório achar um lugar para morar em Canasvieiras. Inocentes, fomos nas agências e, obviamente, não encontramos nada por menos de R$100 a diária, para cada um. Sendo mais espertos, começamos a perguntar para as pessoas do comércio e na favelinha de Canas. Até que indo embora, tive uma (boa) ideia. Em um dos lugares que fui, uma vó alugava barracões e no fundo tinha uma casinha de boneca. Entenda, como trabalhava o dia todo, só precisava de um lugar para dormir e no local tinha cozinha e banheiro comunitário. Acertamos por R$250 o mês e ali fiquei: 30 dias na casinha de boneca.

A casinha de boneca tinha a minha altura e a largura dos meus braços abertos. Colocamos um lençol dividindo o espaço, o Cadico de um lado e eu de outro. A mochila era o travesseiro. Chegaram a caber 8 pessoas lá dentro: 4 de um lado, 4 de outro e a janelinha aberta, onde passava o braço afim de pegar a cerveja no isopor que ficava na sacadinha.

Após uma semana, o Cadico foi embora. Não tivemos desentendimentos, mas depois disso, só o vi uma vez na vida, de passagem, aquele “oi” rápido e até hoje não sei o nome dele. Mas antes de nos despedirmos dele nessa história, tenho que terminar o nosso primeiro dia lá.

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